Ex-presidente conclamou a sociedade para defender a Educação, a ciência, o meio ambiente, os direitos humanos, a Saúde e “demais patrimônios da Nação”
O ex-presidente Lula (PT) participou nesta quinta-feira (28) da 74ª Reunião Anual da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), em Brasília (DF). O evento acontece na Universidade de Brasília (UnB).
O petista, em discurso de exaltação da classe científica, declarou que Jair Bolsonaro (PL) fez o Brasil retroceder e se comprometeu a fomentar o desenvolvimento tecnológico nas mais diversas áreas.
Leia a íntegra do discurso:
“Em primeiro lugar, quero parabenizar e agradecer aos pesquisadores e pesquisadoras. Aos professores, professoras e estudantes. A todos os trabalhadores e trabalhadoras da Educação, da Ciência e da Tecnologia, pelo trabalho dedicado que vocês realizam.
Parabenizo e agradeço às entidades científicas e instituições de ensino e pesquisa pelo que têm feito pelo Brasil, mesmo em um contexto tão adverso, como vivemos atualmente.
Quero também fazer uma homenagem especial à Universidade de Brasília pelos 60 anos de uma vida dedicada à produção de conhecimento e à luta pela democracia. A UnB nasceu do sonho de Darcy Ribeiro e Anísio Teixeira, e é a prova viva de que sonhar vale a pena.
Há 24 anos, em julho de 1998, quando era candidato à Presidência da República, atendi a um convite da SBPC semelhante a este, para estar presente na reunião anual realizada em Natal.
O objetivo, também semelhante ao de hoje, era conversar com os pesquisadores e estudantes sobre nossas propostas para a Ciência e a Educação.
Não fui eleito naquele ano, mas quando assumi a Presidência, em 2003, logo começamos a trabalhar com a comunidade científica para discutir propostas e meios de torná-las realidade.
Uma das primeiras medidas que tomamos foi reativar o Conselho de Ciência e Tecnologia, o CCT, pois eu sabia que era o melhor fórum para o Governo dialogar com a comunidade científica e com os empresários.
Nos meus oito anos de governo, presidi pessoalmente as reuniões do CCT pelo menos uma vez a cada ano. As reuniões das quais não pude participar foram presididas pelo ministro chefe da Casa Civil, que depois me relatava as discussões e as decisões.
Foi assim que nós definimos prioridades, diretrizes, estratégias e ações para uma nova política de ciência e tecnologia, implantada em 2004, quando o ministro da Ciência era o saudoso Eduardo Campos.
No meu segundo mandato, evoluímos para lançar o Plano de Ação em Ciência, Tecnologia e Inovação, com um detalhamento dos programas para a área, cada um com seus objetivos, metas, justificativas e orçamento.
O PAC da Ciência foi discutido e aprovado pelo CCT antes de ser lançado publicamente. E nos quatro anos do PAC, de 2007 a 2010, o Plano foi integralmente executado, com recursos de R$ 41 bilhões de reais, que correspondem em moeda de hoje a mais de R$ 70 bilhões de reais.
O Governo da presidenta Dilma deu continuidade às nossas iniciativas e intensificou os programas e ações por meio da Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, de 2012-2015.
E foi assim que o país saltou de um patamar de investimentos em Pesquisa e Desenvolvimento de 0,88% do PIB, no ano 2000, para 1,24% em 2013, sendo o melhor resultado conquistado em 37 anos de existência do Ministério da Ciência e Tecnologia.
Em 2008, tive o prazer de visitar a sede da SBPC em São Paulo acompanhado de alguns ministros, sendo recebido pelo saudoso Marco Antônio Raupp, seu presidente.
Foi a primeira vez, e, pelo que sei, a única em que um presidente da República visitou a histórica sede da Rua Maria Antônia, para simbolizar a importância do diálogo com a comunidade científica.
Solicitei à SBPC que me trouxesse a ‘cesta de problemas’ da área, e ali se iniciou a discussão do Marco Legal de Ciência, Tecnologia e Inovação, que seria aprovado anos depois.
Na época, comemorávamos os avanços que alcançamos na produção do conhecimento, na pesquisa e no desenvolvimento da inovação neste país.
Mas sabíamos que tínhamos dado apenas os primeiros passos para reduzir nossos graves problemas históricos em muitos setores da economia e no enfrentamento das desigualdades.
Meus amigos e minhas amigas.
A implementação dos Planos Plurianuais em nossos governos deu início à aceleração dos investimentos em educação e em infraestrutura, fortalecendo as cadeias produtivas e o fomento à inovação.
O objetivo central era alavancar a economia brasileira, e conjugar o crescimento com a inclusão social, construindo, por fim, a base para a ‘sociedade do conhecimento’. Tais frentes de expansão tinham também, como eixos dinâmicos, a dimensão ambiental e territorial.
A integração e complementariedade entre essas dimensões exigiram aumentar a eficiência da coordenação das ações dos Governos do PT. Nesse sentido, as políticas de Ciência, Tecnologia e Inovação tiveram estreita articulação com diversos programas.
Cito como exemplos a Política Industrial Tecnológica e de Comércio Exterior de 2005-2007. A Política de Desenvolvimento Produtivo de 2008-2010. O Plano Brasil Maior, lançado em agosto de 2011. Os Projetos de Parcerias para o Desenvolvimento do Complexo Industrial da Saúde.
Ou seja: a ciência e a tecnologia foram alçadas à condição de eixo central da nossa política de governo.
Infelizmente, o golpe contra a democracia, em 2016, deu início ao desmonte das instituições públicas. O chamado Teto dos Gastos, que tira dos pobres para dar aos riscos, aprofundou a agenda neoliberal na direção do estado mínimo.
Ultrapassando as piores previsões, o atual governo colocou o Brasil numa máquina do tempo rumo ao passado. Fome, desemprego, destruição dos direitos trabalhistas, inflação, corrupção e ameaças à democracia são as marcas desse desgoverno que nega a ciência em todos os seus atos.
O resultado mais trágico desse apagão científico que estamos sofrendo hoje são os quase 680 mil brasileiros mortos pela Covid. Muitos deles porque o atual presidente ignorou todas as recomendações da comunidade científica, chegando ao cúmulo de boicotar as vacinas, que salvaram milhões de vidas ao redor do mundo.
A redução dos investimentos em áreas essenciais –sobretudo educação e ciência –, o ataque às universidades públicas, o desemprego e a precarização da força de trabalho estão levando à perda de pessoal qualificado para o exterior.
Os jovens são movidos por sonhos e desafios, e nós precisamos trazer de volta as condições para que eles sejam estimulados a atuar na melhoria e na reconstrução do país.
Como todas e todos aqui sabem, o orçamento do FNDCT, principal fundo de apoio à Ciência, passou a ser fortemente contingenciado desde o golpe de 2016.
Enquanto no último ano de meu Governo a receita do Fundo foi inteiramente investida em ciência, no ano passado, do total de R$ 6 bilhões arrecadados, apenas 10 % foram liberados para execução.
Do mesmo modo, nos últimos anos os orçamentos do CNPq e da CAPES despencaram, e este ano são inferiores a um terço dos valores de 2015.
Mas eu estou certo de que seremos capazes de fazer com que a pesquisa científica, a inovação e a educação sejam colocadas novamente no centro das questões nacionais.
Que elas sejam revalorizadas como alavancas para o crescimento econômico, a reindustrialização do país e a redução da pobreza, buscando uma economia ambientalmente sustentável e solidária.
Minhas amigas e meus amigos.
Quero agora apresentar os principais pontos de nosso programa de Governo para Ciência e Tecnologia.
Em primeiro lugar, vamos trabalhar na reconstrução do Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, conectando as políticas públicas com os desafios sociais. O Sistema deverá promover a colaboração de agências federais, estaduais e municipais, no fomento de programas e ações em todas as regiões do país.
Vamos revigorar o Conselho de Ciência e Tecnologia e envolver as sociedades científicas numa grande discussão sobre os problemas nacionais e suas soluções.
Vamos realizar a Quinta Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, para o envolvimento dos cientistas, dos empresários, dos trabalhadores, dos agentes de governo, dos jovens e da sociedade brasileira como um todo.
Vamos trabalhar na recomposição e ampliação do Fomento de Ciência, Tecnologia e Inovação, para alavancar o Sistema.
Os orçamentos das agências de fomento federais, destacadamente os do CNPq, FINEP e CAPES devem ser recuperados e ampliados a partir dos patamares mais elevados alcançados nos governos do PT.
Os investimentos para a área serão ampliados com a destinação de parcela dos recursos do Fundo Social do Pré-Sal.
Vamos trabalhar para ampliar e melhorar a qualidade da educação em todos os níveis no Brasil, desde a educação básica à pós-graduação, passando por um Programa Emergencial de Inclusão e Reintegração Educacional para os jovens sem escola nos diferentes graus educacionais, com atenção prioritária à universalização da inclusão digital.
Vamos apoiar iniciativas para estimular a inovação no ambiente empresarial, com projetos de pesquisa, desenvolvimento tecnológico e inovação em empresas.
Precisamos elevar a competitividade na produção industrial, o aumento das exportações, a substituição das importações, a intensificação e internalização tecnológica e o desenvolvimento de novos segmentos.
Vamos incentivar a criação e consolidação de empresas privadas, públicas/estatais e empreendimentos de propriedade compartilhada, intensivas em tecnologia em setores de média e alta tecnologia e indústria 4.0.
Precisamos promover ações de popularização e difusão da ciência e expandir o uso de tecnologias inclusivas e garantir a ampliação da cobertura de Banda Larga, levando conectividade a áreas remotas.
Queremos incentivar pesquisas conectadas ao potencial dos diversos biomas brasileiros, com destaque para Amazônia, por meio de estratégias que permitam a inovação não destrutiva, sustentável e socialmente justa.
Esta proposta deve mobilizar as universidades, as instituições de pesquisa e gerar estímulos coordenados, a partir do Estado, para os investimentos privados. É fundamental a inclusão socioprodutiva de povos indígenas, populações tradicionais e agricultores familiares.
Meus amigos e minhas amigas.
Um projeto de nação capaz de enfrentar os desafios do tempo presente, rumo ao futuro, não pode renunciar a alguns compromissos fundamentais: a democracia, o desenvolvimento econômico, educacional, científico e tecnológico, a inclusão social, a redução das assimetrias regionais e a pluralidade cultural.
A soberania nacional e a defesa do meio ambiente devem caminhar juntas e orientadas para a ampliação da cidadania, do trabalho e da renda.
O avanço nestes campos foi – e é – fruto de lutas e resistências das forças progressistas ao longo da nossa trajetória histórica, e, portanto, deve ser defendido e aprofundado.
Estou aqui, mais uma vez, conclamando a sociedade brasileira para que se mobilize em defesa da Educação, da Ciência, Tecnologia e Inovação, do Meio Ambiente, dos Direitos Humanos, da Saúde e demais patrimônios da Nação.
Lutemos pela preservação da vida, pela garantia da soberania e a redução das desigualdades em nosso país.
Convido a todos e a todas para o avanço na retomada do processo de desenvolvimento, numa perspectiva do uso dos recursos naturais com sustentabilidade e inclusão.
Vamos construir juntos um país em que a fome seja extinta para sempre. Um país em que todos os brasileiros e brasileiras tenham acesso a educação, saúde, moradia, emprego com salário digno e direitos garantidos, e oportunidades para conquistar uma vida melhor.
Um país em que a ciência seja reconhecida como o que ela de fato é: uma ferramenta extraordinária para o progresso da humanidade.
E que esse progresso não seja jamais privilégio de poucos, mas um direito de cada brasileiro e de cada brasileira.
Um grande abraço”.
Com informações: BRASIL 247