Um dia histórico. Com um voto duro do ministro Alexandre de Moraes, o Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou, nesta quarta-feira (13), o julgamento dos quatro primeiros acusados pelos ataques terroristas de 8 de janeiro (veja perfis abaixo).
Relator do caso, Moraes apresentou seu voto sobre o primeiro réu, Aécio Lúcio Costa Pereira. O ministro defendeu a condenação por cinco crimes (abolição do Estado Democrático de Direito, dano qualificado, golpe de Estado, deterioração do patrimônio tombado e associação criminosa) e defendeu a pena de 17 anos de prisão, sendo 15 anos e 6 meses de reclusão e um ano e seis meses de detenção em regime aberto.
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Agora, caberá aos demais ministros da Corte dizer se seguem ou não o voto do colega. Na sessão desta quarta-feira, o único a votar além do relator foi Nunes Marques, que divergiu parcialmente de Moraes. Ele defendeu a condenação por apenas dois crimes (dano qualificado e deterioração do patrimônio) e pena de 2 anos e 6 meses de reclusão, em regime inicial aberto.
No fim da tarde, a presidenta do STF, Rosa Weber, suspendeu o julgamento, que será retomado nesta quinta (14), às 9h30.
Turba de golpistas
Ao proferir seu voto, Alexandre de Moraes chamou a atenção para a gravidade do que ocorreu no dia 8. “Não existe aqui liberdade de manifestação para atentar contra a democracia, para pedir ato institucional número 5, para pedir a volta da tortura, para pedir a morte dos inimigos políticos, os comunistas, para pedir intervenção militar. Isso é crime”.
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A conduta dos réus foi a de uma turba de golpistas com “clamor doentio por intervenção do Exército”, para derrubar um governo legitimamente eleito, salientou Moraes, que exibiu fotos e vídeos da invasão das sedes dos Três Poderes.
“A ideia era que, a partir dessa destruição, com essa tomada dos três prédios, houvesse a necessidade de uma GLO (Garantia da Lei e da Ordem). E, com isso, estavam pedindo que as forças militares aderissem a esse golpe de Estado”, salientou. “A tentativa de morte da democracia não é pacífica. É um ato violentíssimo contra o Estado Democrático de Direito”, completou.
Foram exibidos também vídeos de Aécio na Mesa Diretora do Senado durante as depredações e dele discursando no parlatório, afirmando que não aceitaria o “governo fraudulento” de Lula nem “deixaria o comunismo entrar”.
O ministro ainda fez críticas à omissão de autoridades das forças de segurança que estão presas ou sendo investigadas e disse que o 8 de Janeiro foi a culminação de uma “escalada golpista violenta” que ocorreu no país desde as eleições.
O crime cometido pelos réus, segundo Moraes, foi multitudinário, ou seja, praticado por uma multidão que deve responder pelo resultado provocado. A explicação foi em resposta às defesas, que questionavam a ausência de individualização da conduta de cada acusado. No total, a Procuradoria Geral da República (PGR) apresentou 1.390 denúncias contra acusados de participar dos ataques.
Parlamentares do PT se manifestam
Parlamentares do PT se manifestaram sobre o início do julgamento, esperando uma justa punição aos que atacaram a democracia. “Alexandre de Moraes duríssimo e certíssimo no julgamento do 8 de janeiro. Punir ímpeto golpista é fundamental pra cortar o mal pela raiz”, defendeu a presidenta nacional do PT, a deputada federal Gleisi Hoffmann (PR).
“O julgamento dos que atentaram contra o nosso Estado Democrático de Direito é mais uma etapa importante no fortalecimento das instituições e dos poderes”, avaliou o líder do PT no Senado, Fabiano Contarato (ES).
“A lei deve alcançar todos que atuaram para tentar desestabilizar a democracia brasileira. Devem ser responsabilizados e punidos não apenas os que apareceram na fotografia do 8 de janeiro, mas todos que, de alguma forma, incentivaram, fomentaram ou financiaram qualquer tipo de ataque”, ressaltou o senador nas redes sociais.
O deputado Rogério Correia (PT-ES), membro da CPMI do Golpe, também se manifestou pela internet. “Ninguém está acima da Justiça. Aos que atentaram contra nossa democracia, desejo todo o peso da lei.”
Já o líder do PT na Câmara, deputado Zeca Dirceu (PR), rebateu o discurso bolsonarista de que o julgamento é político. “Existem provas robustas dos crimes praticados, houve direito à defesa, alguns réus são até réus confessos.”
Vitória da democracia
Ao se pronunciar no início do julgamento, o subprocurador-Geral da República, Carlos Frederico Santos, exaltou a força da democracia brasileira. “É importante registrar que o Brasil há muito deixou de ser uma República das Bananas. Golpe de Estado é página virada na nossa história”, analisou.
Santos afirmou ainda que os atos de 8 de janeiro foram uma tentativa de golpear Lula, presidente democraticamente eleito, sob falso pretexto. “Buscou-se, falando em linguagem mais clara, derrubar um governo que foi legitimamente eleito, através do sufrágio universal, a pretexto de ter ocorrido fraude nas eleições”, afirmou.
Até 9 de janeiro, dia seguinte aos ataques, foram presas em flagrante 2.151 pessoas, sendo que 1.341 acabaram denunciadas pela PGR e se tornaram rés. Em agosto, 49 deles permaneciam presos, segundo o STF.
Papelão da defesa
Um dos advogados de defesa, o desembargador aposentado Sebastião Reis Coelho é suspeito de incitar atos golpistas e por isso tem sua conduta apurada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Ele chegou a dizer que o ministro Alexandre de Moraes deveria se declarar suspeito para julgar o processo.
Em sua fala, o ministro defendeu a competência do Supremo para julgar a ação e enfatizou a gravidade dos ataques. “Às vezes, o terraplanismo e o negacionismo obscuro de algumas pessoas faz parecer que no dia 8 de janeiro tivemos um domingo no parque. Então as pessoas vieram, pegaram um ticket, pegaram uma fila (…) vamos invadir o Supremo”, rebateu.
Gleisi Hoffmann aplaudiu a resposta de Moraes e classificou o desempenho do advogado como um “papelão”. “Não foi um domingo no parque, foi uma tentativa de golpe, como o próprio ministro atestou. Sem anistia!”, afirmou.
Perfil dos acusados
Aécio Lúcio Costa Pereira mora em Diadema (SP), tem 51 anos e era técnico em sistemas de saneamento da Sabesp, que o demitiu após 8 de janeiro. Foi preso em flagrante dentro do Senado, pela Polícia Legislativa. Com uma camisa com os dizeres “intervenção militar federal”, acabou produzindo provas contra si ao gravar um vídeo, sentado na mesa do Plenário, dizendo: “Amigos da Sabesp: quem não acreditou, tamo aqui. Quem não acreditou, tô aqui por vocês também, porra! Olha onde eu estou: na mesa do presidente. Vai dar certo. Não desistam. Saiam às ruas. Parem as avenidas. Dê corroboro para nós”, disse.
Matheus Lima de Carvalho Lázaro, 24 anos, disse trabalhar como entregador e declarou ser bolsonarista, nacionalista e frequentar igreja evangélica. É de Apucarana (PR). A PGR informou que ele estava com um grupo de bolsonaristas com estilingues, bombas, gasolina, álcool, vinagre, produtos inflamáveis e material que poderia ser usado para fazer coquetéis Molotov. Em seu celular foram encontradas mensagens com os seguintes conteúdos: “É por isso que nóis tá aqui. Pra intervenção militar… O Exército toma o poder, entendeu?”. Nos depoimentos, declarou que foi a Brasília“para que não fosse pautado isso, para virar banheiro masculino junto com homem e mulher, liberação de droga. Foi isso que a gente veio lutar”, disse. A PGR informou que “o prejuízo causado pelo grupo criminoso do qual faz parte Matheus alcançou, conforme avaliações preliminares, R$ 3,5 milhões no Senado Federal e R$ 1,1 milhão na Câmara dos Deputados”.
Moacir José dos Santos, 52 anos, paranaense, foi preso em flagrante pela Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) e disse ter ido a Brasília em ônibus fretado, sem pagar pela viagem. O Ministério Público informou que ele quebrou vidros, depredou móveis e obras de arte. Dentro do Palácio do Planalto, ele participou ativamente e concorreu com os demais agentes para a destruição dos móveis que ali se encontravam. “Todos gritavam palavras de ordem demonstrativas da intenção de deposição do governo legitimamente constituído, como ‘fora, Lula’, ‘presidente ladrão’, ‘presidiário’”, afirmou a PGR.
Thiago de Assis Mathar foi preso em flagrante dentro do Palácio do Planalto. É de São José do Rio Preto (SP) e diz ser autônomo no trabalho de manutenções elétricas e hidráulicas. Seu advogado afirmou em nota que não há “nenhum tipo de prova” contra Mathar e ele “apenas estava na hora errada no momento errado”. A acusação diz que ele atuou para destruir o patrimônio público no Palácio e, com “violência e grave ameaça”, tinha a intenção de “abolir o Estado Democrático de Direito”, além de “depor o governo legitimamente constituído”.
Fonte: Redação do PT Nacional
Foto: Rosinei Coutinho/STF