Nesta quinta-feira (14/3), a ministra Sonia Guajajara abriu, no Vaticano, o encontro organizado pela Academia Pontifícia de Ciências e de Ciências Sociais, que reuniu cientistas, indígenas e religiosos de vários povos e países para discutir em a contribuição do conhecimento indígena na busca de soluções para as crises ambiental e humanitária no mundo.
Em seu discurso, Sonia Guajajara saudou a importância do seminário e o convite do Vaticano para que os povos indígenas dividissem aquele histórico espaço da ciência com renomados cientistas e autoridades. A Academia Pontifícia de Ciências tem sua origem na Academia dos Linces, fundada em Roma, em 1603, como a primeira academia exclusivamente científica do mundo, e teve entre seus primeiros membros o astrônomo, físico e engenheiro Galileu Galilei (1564-1642).
“Quando tomei posse como a primeira ministra dos Povos Indígenas do Brasil, o lema do meu discurso foi: Nunca Mais um Brasil sem nós. Estamos aqui, com o apoio do Vaticano, para reforçar que o mundo precisa dos conhecimentos tradicionais indígenas. O mundo precisa do modo de vida indígena, de sua espiritualidade e de sua relação com a natureza, como condição necessária para a proteção da biodiversidade”, disse a ministra, lembrando que a importância dos saber indígenas também tem sido discutida por outras entidades como a Organização Mundial de Propriedade Intelectual e a Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica.
“Não é por coincidência que 80% da biodiversidade protegida no mundo está em territórios indígenas. É porque sabemos como fazer esta proteção”, disse Sonia Guajajara, apontando que, no entanto, as populações indígenas estão entre as mais atingidas pelos eventos climáticos extremos, e que luta contra a mudança climática exige o reconhecimento do direito à posse plena dos territórios pelos povos indígenas e comunidades locais.
A ministra destacou ainda os impactos das ações de mitigação e de transição adotadas para conter a crise climática que não levam em conta aspectos centrais das comunidades indígenas, apontando a necessidade de se regulamentar os mercados de crédito de carbono de uma forma justa, sem que contratos abusivos mediados por terceiros acabem com a proteção da biodiversidade feita pelos povos indígenas com seus conhecimentos tradicionais e modos de vida.
Em seu pronunciamento o Papa Francisco disse que aquele encontro enviava uma mensagem aos líderes governamentais e às organizações internacionais, encorajando-os a reconhecer e respeitar a rica diversidade que há dentro da grande família humana. “O tecido da humanidade é tramado com uma variedade de culturas, tradições, espiritualidades e linguagens que deve ser protegidas, visto que sua perda representaria o empobrecimento de conhecimento, identidade e memória para todos nós”, disse o Papa.
A ministra anunciou durante seu discurso a adesão do Brasil à Coalizão dos Sistemas Alimentares Indígenas da FAO, a agência das Nações Unidas para a Agricultura, e o lançamento pelo Governo Federal de uma nova cesta básica destinada aos povos indígenas no Brasil que valoriza os sistemas alimentares locais e afasta os alimentos processados, destacando a importância do financiamento multilateral para os sistemas alimentares indígenas de todo o mundo “Muitas vezes, naquelas comunidades mais atacadas e violentadas, a melhor saída para manter vivos os conhecimentos tradicionais é garantir alimentação e apoio à produção, conforme estes conhecimentos.“
Ao mencionar os ataques e genocídios contra os indígenas ao longo da história, a ministra lembrou que a própria Igreja Católica foi agente desta violência. “E hoje estamos aqui, Igrejas e povos indígenas, para avançar no debate sobre conhecimentos tradicionais e passar grandes mensagens ao mundo”.
Sonia Guajajara defendeu ainda que a pauta do Meio Ambiente esteja unida à pauta dos Direitos Humanos e pela paz, repudiando a violência vivida pelo povo palestino. “A cura para a doença das mudanças climáticas é complexa, e exige uma mudança radical nos modos de vida da sociedade. Nossas culturas, nossa espiritualidade, sejam elas católicas, indígenas e tantas outras, são culturas de paz, que querem a harmonia do ser humano com a natureza, ao invés da ganância e da expropriação dos territórios”.
Por: Ministério dos Povos Indígenas (MPI)
Foto: Divulgação/Vaticano