Na análise preliminar do Projeto de Lei Complementar (PLC) 75/2023, de autoria do Executivo, podemos apontar três problemas decorrentes da concepção e construção do projeto.
O primeiro é o pecado do autoritarismo do governo do estado que não se preocupou em consultar, ouvir ou incluir as entidades representativas de policiais civis e militares na composição do projeto de lei complementar. Diferentemente dos governos democráticos e populares, segundo consta, o governo Tarcísio de Freitas instituiu um grupo de trabalho para estudar o reajuste, grupo que sequer incluiu os deputados estaduais militares que compõem a sua própria base de apoio na Assembleia Legislativa. Não estamos defendendo a base parlamentar do governo, apenas queremos destacar que, se não ouvem a própria base, não iriam ouvir a representação sindical dos servidores da Segurança Pública.
O segundo problema diz respeito à justiça e isonomia entre todas as categoriais e classes de profissionais das polícias civil e militar. Ao propor índices de reajuste escalados por carreira ou classe, o governo do estado de São Paulo diferencia os trabalhadores da Segurança Pública, privilegiando alguns e prejudicando outros, o que faz surgir um descontentamento generalizado que vem se expressando por meio dos sindicatos e associações de classe.
Para ilustrar os efeitos dos reajustes escalonados, servimo-nos de exemplos contidos no “Ranking de salários base – SSP/SP” que classifica a posição da carreira ou classe segundo o salário percebido. Na tabela, a carreira “Delegado de Polícia – Classe Especial” atualmente ocupa a terceira colocação entre os salários-base mais altos. Com o reajuste escalonado, passa a figurar em sexto lugar. Também caíram no ranking: “Delegado de Polícia – 1ª Classe” (da 6ª para a 8ª colocação), “Delegado de Polícia – 2ª Classe” (da 9ª para a 12ª), “Escrivão de Polícia” e “Investigador de Polícia – 1ª Classe” (da 17ª para a 18ª), entre outros. É evidente que não ficam satisfeitos os que ocupavam determinadas posições no ranking e se veem “rebaixados” por um mecanismo de reajustes desiguais.
Em termos percentuais os problemas decorrentes das desigualdades se acentuam. Tarcísio argumentou que os reajustes contemplam determinadas funções de base para evitar a evasão de profissionais da Segurança Pública. O maior índice de reajuste para militares é 34,24% para “Aluno Oficial”, em seguida o de 31,62% (Soldado 2ª Classe), e 30,85% (Subtenente). O menor índice é o de 13,71% para “2º Tenente”, enquanto para “1º Tenente”, o reajuste seria de 28,87%. Quase tão baixo quanto o índice para o “2º Tenente” é o destinado ao “3º Sargento” (15,18%) e, nesse caso, suspeita-se que os reajustes para essas duas funções foram baixos, porque elas perfazem o maior contingente de militares na inatividade e reajustes maiores onerariam as contas previdenciárias.
Os reajustes para os policiais civis seguem a mesma lógica: o maior índice (24,64%) é destinado a “Escrivão 3ª Classe” e a “Investigador 3ª Classe”, seguido de 24,09% atribuído a “Médico Legista 3ª Classe” e a “Perito 3ª Classe” e 22,24% destinado a “Médico Legista 2ª Classe”. O menor reajuste é de 14,27% destinado a “Delegado classe especial”. Em relação aos investigadores e escrivães de polícia, a Lei Complementar nº 1.067/2008 determina como requisito para o exercício destas funções, possuir-se graduação de nível superior. Assim, elas se equivalem à função de “perito”, razão pela qual os salários deveriam ser iguais. Pelos descuidos e diferenças aqui citadas, constatamos que o projeto de Tarcísio de Freitas caracteriza-se pela desigualdade.
O último problema imediato que detectamos na proposta do governo diz respeito às aposentadorias. Atualmente os policiais militares inativos e pensionistas sofrem o desconto de 11% sobre o valor que excede o benefício-teto do Regime Geral da Previdência Social (R$ 7.507,49 = valor teto atual). A proposta do Tarcísio prevê a redução desse índice para 10,5%, porém, esses 10,5% passam a incidir sobre a totalidade do valor dos proventos de inatividades e pensões, o que representa perda salarial. A redução do índice de contribuição é, portanto, um presente de grego do governo de Tarcísio de Freitas para os aposentados e pensionistas.
Continuamos nos reunindo com os representantes das diversas categorias de policiais civis e de militares, fazendo a crítica aos pontos negativos da proposta na Comissão de Segurança Pública e Assuntos Penitenciários, de forma a tentarmos sensibilizar outros deputados em relação aos prejuízos claros para algumas funções, caso o projeto venha a ser aprovado da forma como está. E, ainda, construindo emendas ao PLC 75/2023 que possam corrigir esses pontos problemáticos
*Paulo Batista dos Reis é Investigador de Polícia e Deputado Estadual
Assista vídeo do Instagram, com a opinião do deputado Reis, no dia da visita de Tarcísio na Alesp: